28 de outubro de 2010

Central Vazia (ou A Solitude)

Correu até a borda da varanda, olhou lá pra baixo, na rua, observou os carros, que, desgovernados por não terem mãos nos seus volantes nem pés nos seus pedais, tinham se chocado entre si e com a paisagem. Olhou para o horizonte, os olhos vasculhando a imensidão procurando por algum movimento que não o das nuvens no alto. Correu escadaria abaixo, procurou pelo porteiro, pelo jornaleiro, mas não encontrou. Esperou um ônibus por um minuto – talvez menos – mas impaciente com o silêncio que, num zumbido ensurdecedor, lhe penetrava os ouvidos, desatou a correr pela rua, em direção ao único lugar que lhe rendia um fio, um filete, de parca esperança. Entrou, ofegante, com ânsia, na Central do Brasil. Ninguém.

Saiu pelo portão, agora já com mais calma, devagar, de cabeça baixa, e olhou para o céu como se se, só então, se conformasse, e até como se gostasse um pouco da idéia, como se fosse uma escolha própria. Era a única pessoa existente na face da Terra.

2 comentários:

amaraborde disse...

Sentir-se um estranho no ninho num mundo com zilhôes de pessoas, ou sentir-se completo num mundo vazio de gente... Algo a se pensar...

Gostei disso!!

Daniel Gaivota disse...

Acho que é essa a essência. Pensei em escrever algo mais longo, tipo uma releitura (ou reescritura?) do Robinson Crusoé mas nessa linha de solitude/solidão, nessa idéia do se esvaziar de gente pra se completar como gente. Péssima idéia? Talvez, mas quem sabe? Adoro péssimas idéias. :)