18 de maio de 2009

Vício

Anda até a janela, sem camisa, sentindo frio. Atrás de si, a cama, mas ninguém sobre ela. Nenhuma mulher de nenhum tipo, e a respeito deles, se fôssemos listá-los aqui todos não haveria espaço. Ele está sozinho no quarto, mergulhado na mais lúgubre penumbra, uma penumbra densa, que sugere a presença de uma tensão no ambiente; uma tensão sexual. Há muito tempo este quarto não comportava apenas uma pessoa. Durante muito tempo, ele (o homem à janela) não esteve sozinho – em todas as noites uma mulher diferente dividia com ele o espaço. Seu analista disse que era uma compulsão. Disse algum nome que significava que o paciente (que já não tinha mais muita paciência pra isso, e por isso nunca mais voltou) era viciado em sexo. E bem, de fato, não era admissível passar uma noite sem uma par.
As mãos a princípio atrapalhadas, sem saber aonde parar, as pernas se tocando, primeiro tímidas entre si e depois certas, explorando-se com vontade. A pele, em sua textura, cor, cheiro, gosto. O conhecer cada linha, cada curva da vastidão pessoal que se escondeu por tanto tempo, e que vai se mostrando pouco a pouco às mãos, agora já mais decisivas e aos olhos, quando estes não se fecham. A respiração dos dois corpos progressivamente se tornando uníssona, ritmada. Os dois corpos enlaçados, como se se atraíssem, como se nada mais pudesse separá-los; o mistério revelado, a exploração, desvelamento do desconhecido, o mapear de cada centímetro de pele do corpo do outro com as mãos, braços, pernas, lábios, dentes; a tensão, a última tensão, do gozo final, firme, tensa... E o enfim relaxar.
E já que vai relaxar, acende um cigarro, por mais clichê que soe, por mais ridículo pareça; ele sempre acende um cigarro ao terminar e o fuma inteiro antes de dizer ou fazer qualquer outra coisa. O brilho da chama em contato com a ponta do cigarro, o calor, todo aquele calor que há pouco estava espalhado nos corpos, agora se concentra na ponta do pequeno bastão. O primeiro trago, observando bem como aquela brasa se encontra submissa ao seu fôlego – assim como a do ato recém-terminado –, invadindo o peito como se fizesse com que os alvéolos acordassem, como se só então percebesse que de fato há pulmões. Libera, então, a fumaça clara; os olhos semicerrados, a cabeça para trás, o corpo, o ar, a mente... E o enfim relaxar.
Está lá agora, sentindo um pouco de frio, a cama vazia atrás, sozinho. Mas não completamente. Vai até a janela, olha o mundo lá fora e pensa em quantas mulheres com as quais nunca esteve estão esperando por ele, em que tipo de mulher poderia estar na cama atrás de si, e em como depois nunca mais a veria. E conclui que tudo isso é estupidez. Leva a mão à boca. Não precisa de mulher alguma, nunca precisou. Acende o fósforo. Ele na verdade não faz questão alguma do sexo. Traga. É viciado em cigarros.